Alcalóides são princípios ativos, contendo um nitrogênio heterocíclico, isolados de plantas de vários gêneros, que pertencem a mais de 158 famílias botânicas, sendo em muitos casos, metabólitos secundários. No seu meio de origem, os alcalóides existem na forma de sais de ácidos orgânicos, tais como ácido láctico, málico, tartárico ou cítrico. Apesar do grande número de substâncias sintéticas, os alcalóides ainda representam um dos mais potentes grupos de compostos para o tratamento de muitas doenças. Entre os vários alcalóides citotóxicos, os mais estudados devido a sua atividade citotóxica, estão os compostos de três gêneros; Vinca (Catharantus), Taxus e Camptotheca.

A camptotecina é um fármaco que apresenta uma considerável atividade antitumoral cujo mecanismo de ação envolve a inibição da topoisomerase I, enzima presente em altas concentrações nos tumores. Entretanto, a administração intravenosa deste fármaco é limitada devido a sua baixa solubilidade aquosa em soluções apresentando baixos valores de pH, e a sua inativação, decorrente da abertura do anel lactônico, em pH fisiológico. Além disso, a administração de camptotecina em doses baixas e protocolos prolongados têm demonstrado ser mais efetiva para o tratamento do câncer do que o emprego de altas doses por um curto período de tempo, tornando este fármaco perfeitamente adaptável para a utilização em estratégias terapêuticas que visam a liberação prolongada.

A camptotecina é um alcalóide citotóxico encontrado na casca da Camptotheca acuminata, uma árvore nativa da China, cujo mecanismo de ação consiste na inibição da enzima topoisomerase I, envolvida nos processos de transcrição e replicação do ADN e que se encontra altamente expressa nos tumores. Entretanto, a camptotecina é uma substância altamente hidrofóbica que inviabiliza a sua administração pela via intravenosa na forma de perfusão. Além disso, este fármaco apresenta uma elevada instabilidade em pH fisiológico, decorrente da abertura do anel lactônico e formação de sua forma carboxilada menos ativa. Estudos de estabilidade da camptotecina em tampão fosfato pH 7,4 indicaram que unicamente 13% do fármaco encontra-se na sua forma lactônica, apresentando um tempo de meia vida plasmática de apenas 11 minutos. Por outro lado, estudos clínicos têm revelado que a camptotecina apresenta a mielossupressão como efeito colateral dose-dependente. Além desses, outros distúrbios tais como cistite hemorrágica, náuseas, vômitos e diarréia também foram observados (DEY e WARNER, 1997). O conjunto destas características faz com que este fármaco seja um bom candidato para a encapsulação nas nanocápsulas.

A camptotecina (CPT) é um alcalóide derivado do arbusto Camptotheca acuminata, Decaisne (Nyssaceae). Esta planta cresce em áreas relativamente quentes do sudoeste chinês, sendo tradicionalmente empregada na medicina chinesa na forma de chá, pó e injetável, para o tratamento de várias doenças, inclusive tumores. A CPT foi isolada durante o período de 1950-1959, por ocasião de um meticuloso estudo que objetivava a obtenção de esteróides como precursores da cortisona. A pesquisa não incluiu apenas análise quantitativa para saponinas esteroidais, mas também análise qualitativa para esteróis, alcalóides, taninos e flavonóides. Alguns destes extratos foram testados para avaliação da atividade antiviral, antibiótica e antitumoral. Após muitos testes, foi verificado que apenas o extrato alcoólico da C. acuminata, apresentava elevada atividade contra CA 755, então empregado como um dos sistemas padrões.

Quimicamente, a camptotecina é um alcalóide pentacíclico altamente insaturado que contém um sistema de anéis quinolônicos (anéis A e B), um anel piridona (anel D) e um anel α-hidroxilactona terminal (anel E). A sua estrutura apresenta um centro quiral (C-20) no anel lactônico (DEY e WARNER, 1996). Apresenta-se como um pó amarelo opaco cristalino, com ponto de fusão de 264 – 267º C e massa molar de 348,11, correspondente a fórmula C20H16N2O4

Após o isolamento e a elucidação estrutural da CPT e de seus análogos 10-hidroxi e 10-metoxi-camptotecina, foi demonstrado que estes fármacos inibiam a síntese de ADN e ARN. Em ensaios em camundongos, a camptotecina demonstrou uma considerável atividade no prolongamento da sobrevida dos animais tratados com células leucêmicas L1210 ou células leucêmicas P388, quando doses entre 0,5 e 4,0 mg/kg foram administradas, bem como na inibição de tumores sólidos, incluindo o tumor de Walker WM. O análogo 10-metoxi-camptotecina mostrou-se menos ativo,

Estudos posteriores evidenciaram que a manutenção do anel lactônico da camptotecina era crucial para a atividade antitumoral. Entretanto, a porção lactônica da molécula é susceptível à hidrólise espontânea, formando a sua correspondente forma carboxilada, num processo onde o equilíbrio é governado pelo pH do meio (Figura 2). Assim a forma lactônica intacta predomina em pH ácido e a presença da espécie carboxilada (anel aberto) é favorecida em meio neutro e alcalino. Apesar da forma carboxilada possuir solubilidade aquosa superior, é cerca de 10 vezes menos potente, explicando os resultados obtidos nos ensaios clínicos realizados.

Mecanismo de conversão da forma lactônica de CPT em carboxilada

O interesse pela camptotecina só foi retomado na década de 80, após a descoberta que seu sítio de ação era a enzima Topoisomerase I. A topoisomerase I é uma enzima nuclear presente em virtualmente todas células somáticas. Trata-se de um polipeptídeo monomérico com massa molar de 100 kD, codificado por um único gene. Similarmente às topoisomerases, a topo I relaxa o ADN espiralado, induzindo o corte na porção fosfodiéster de uma fita simples e permitindo que a fita intacta passe através deste corte, religando, após, a fita ADN. Durante o curso deste ciclo catalítico, uma ligação covalente é estabelecida entre um grupo tirosina no sítio ativo de Topo I e um grupo fosfatase 3’ ao longo da estrutura da ADN, formando o denominado complexo de clivagem.

A camptotecina se liga covalentemente à Topo I estabilizando o complexo ADN-enzima, inibindo fortemente a reação de religação pela Topo I sem afetar a reação de clivagem. A interação entre CPT e Topo I ocorre pelo ataque de um sítio nucleofílico sobre a enzima, na posição acila do anel E do fármaco. A citotoxicidade de CPT pode ser atribuída à interrupção da replicação pelo complexo ADN-enzima-fármaco estabilizado resultando no rompimento da dupla fita e finalmente na cessação da síntese de ARN. Assim, CPT é um fármaco ciclo celular específico da fase S, pois a presença da síntese de ADN é uma condição necessária para induzir a seqüência de eventos levando a citotoxicidade.

Como outros fármacos citotóxicos, a resistência celular à CPT parece ser um fenômeno multifatorial, que potencialmente pode envolver falhas no acúmulo intracelular do fármaco, os quais são dependentes dos sistemas e transporte e metabolismo, alterações qualitativas e quantitativas do alvo resultando em mudanças na interação fármaco-enzima e alterações na resposta celular a partir da formação dos complexos de clivagem, presumidamente pela redução da proporção de células na fase S em certo tempo.

Farmacocinética
A porção lactona na estrutura da CPT é quimicamente instável e sofre hidrólise reversível pH dependente para a forma carboxilada, que é destituída da atividade inibitória de topoisomerase I. Sob condições ácidas (pH<4) a estrutura lactônica predomina, enquanto em valores de pH>10, o anel aberto está exclusivamente presente. No pH fisiológico, o processo de equilíbrio favorece a conversão para a forma carboxilada, também sendo influenciado pela ligação do fármaco à albumina. A diferença na afinidade pela albumina da carboxilada sobre a lactônica foi relatada ser 200 vezes maior, alterando significantemente o equilíbrio em favor do fármaco inativo. Como resultado final, tem-se que na presença de níveis fisiológicos de albumina humana, a forma ativa da CPT apresenta um tempo de meia vida muito curto, de aproximadamente 10 minutos.

A eficácia terapêutica das camptotecinas tem sido avaliada empregando-se diferentes protocolos de administração. Os resultados têm demonstrado que as CPTs são mais efetivas em quando administradas em protocolos prolongados, do que em tratamentos de curta duração com altas doses. Esta característica tem sido atribuída ao fato de que estes fármacos atuam especificamente na fase S do ciclo celular. Uma vez alcançado o nível de citotoxicidade necessário para a atividade inibitória sobre a enzima Topo I, o parâmetro de determina a resposta antitumoral é o tempo de exposição e não o aumento da dose. Além disso, os efeitos tóxicos das CPTs também variaram de acordo com o protocolo de administração

DERIVADOS DE CAMPTOTECINA